domingo, 27 de dezembro de 2015

NEIDE AZEVEDO LOPES E SEU SISTEMA DE AFETOS



Vianney Mesquita*

No momento em que cedemos aos AFETOS, a Terra se metamorfoseia; já não há inverno nem noite, e tudo – tragédias, tédios e deveres – desaparece. (Ralph Waldo EMERSON. * Boston-Mass., 25.05.1803; + Concord-Mass., 27.04.1882).

No Domingo da Divina Misericórdia, caído no dia 11 de abril de 2010, há exatos cinco anos, experimentei a delícia de ler um mimo do Criador, obsequiado à imensa poetisa Neide Azevedo Lopes, logo a mim por ela substabelecido.
A Quadra Pascal ora vivida, a terminar do Dia de Pentecoste, é espiritualmente propícia para se apreciar arte tão edificante, a fim de se teorizar e, em especial, praticar metros e simpatias, como faz a autora de Teoria dos Afetos, desde que adquiriu uso da razão, quando sua vida passou a coincidir com uma rima rica.
Neide Azevedo Lopes fez-me evocar a saudosa poetisa piauiense Sônia Leal Freitas, no Cedro do Éden, monumental obra por mim comentada no texto das suas guarnições em 2002, a rogo seu, após lhe proceder à revista textual e gramatical.
Na Teoria (e na prática, também) dos Afetos, quedo pasmado, como a relembrar o Metal Rosiclerde Cecília Meireles (1960), menos por identidade estilística e mais pelo esplendor vocabular e elevação ideativa, fluência e estro desdobrados, centuplicados a cada elaboração. Nalgumas passagens, Neide, denota, ainda, similitude com Gabriela Mistral (Lucila de Maria de el Perpétuo Socorro Godoy Alcayaga), Nobel de Lireratura (1945), no seu Ternura, enquanto noutras estâncias aparece, ainda, com a elevação comovente da Quarta Marquesa de Alorna (Leonor de Almeida Portugal de Lorena e Lencastre).
Eu não tinha este rosto de hoje,/ Assim calmo, assim triste, assim magro [...] Eu não dei por esta mudança/ Tão simples, tão rápida, tão fácil. [...] – Em que espelho ficou perdida a minha face? (Cecília Meireles).
Senhor! Tu que ensinaste, perdoa que eu ensine; que leve o nome de professora, que Tu levaste sobre a Terra ... (Oração da ProfessoraGabriela Mistral).
Se me aparto de ti, Deus de bondade,/ Que ausência tão cruel!/ Que me leva a um abismo tão terrível/ O pendor infeliz da humanidade (M.A. Obras poéticas da Marquesa de Alorna1844).
Pelo fato de bem o saber, Neide Azevedo Lopes emprega, com propriedade, graça e exatidão, os expedientes figurais admissíveis na poesia, aformoseando superfluamente o encantamento de suas composições. E assim, tomada por um enlevo anímico, veemência dos escolhidos, se achega ao Ressuscitado, para o Qual também solicita o leitor a rezar, ao apreciar suas esmeradas produções.
Tal como sucede com a saudosíssima poetisa Sônia Leal Freitas (Deus a tenha em Sua glória!), sua originalidade e inspiração multíplice de elaborar representações, conformando-as extraordinariamente à Dulcisonam et canoram Linguam Cano, parecem acercá-la de Florbela Espanca (Flor Bela d’Alma da Conceição Espanca), em Alma daConceição, Livro das Mágoas e Charneca em Flor.
A ave da noite rasga a tenda do meu abrigo / e despeja um grito estreito, longo, a língua do punhal./ Caminho dentro dele um corredor comprido sem fim e sem saídas./ Invento a minha fuga e salto dentro do vulcão medonho/ que me vomita em postas. (Sônia Leal Freitas).
Saudades! Sim ... Talvez ... E por que não? ... Se o sonho foi tão alto e forte./ Que pensara vê-lo até à morte/ Deslumbrar-me de luz o coração! / Esquecer? Para quê? Ah, como é vão! Que tudo isso, A ... (FlorbelaEspanca).
Também os efeitos imprimidos nas expressões de musicalidade do seu metro me conduzem a evocar os rafaéis e michellângelos da Capela Sistina, bem assim a expressão da alma nacional da Galícia, de Rosalía de Castro Murguía (cuja casa, em Padrón-A Coruña-Espanha, tive a ventura de conhecer) nseu O Cavaleiro de Botas Azuis, bem como neste excerto de poema, transferido ao leitor em língua nacional galega:
Cantares Galegos
Adiós, rios, adiós fontes/ adiós, regatos pequenos (sic) /adiós, vista dos meus ollos:/ non sei cando nos veremos.
Miña terra, miña terra/ terra donde me eu criei/ hortiña que quero tanto/ Figueiriñas que prantei.
A imortal NEIDE AZEVEDO LOPES, ex-presidente da Academia Cearense de Língua Portuguesa, perfaz uma estrofe perfeita em estâncias de dez ictos do soneto de grade petrarcana, a exornar a poética tematicamente múltipla, de estética inexcedível, beleza desigual, em proporção direita à magnificência de sua adorável pessoa.


*Texto aumentado de Arquiteto a posteriori. Fortaleza: Imprensa Universitária da UFC, 2013. Versão escrita em 11 de abril de 2015.





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